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Tradições Xamânicas nos Andes

 

Napaykuna!

São inúmeras as pessoas que me escrevem do Brasil, Chile, Argentina, Alemanha, Espanha, Portugal, Holanda, Itália, México e Estados Unidos querendo fazer ou afirmando que fizeram os Nove Ritos Iniciáticos do Munay Ki com instrutores autorizados sob a autorização do criador desta “Tradição”, o Dr. Villoldo da The Four Winds Society. Por esta razão e com o desejo de se aprofundar no Xamanismo praticado nos Andes, eles me perguntam o que vem após destes “ritos”, principalmente sobre a origem, história, linhagens, ritos e outras coisas mais das técnicas aprendidas.

Hoje finalmente resolvi responder a essas perguntas e esclarecer, no meu modo de ver, os acontecimentos das escolas e tradições andinas, alguns indígenas e outros não menos autóctones. Espero com este texto colaborar com os iniciados das tradições xamânicas andinas, para que eles tenham um maior leque de conhecimento possível e possam, com base nessa premissa, continuar a aprofundar seus estudos de uma forma ou de outra, se esse for realmente o seu propósito. No final, tudo pode ficar de lado ou em segundo plano, se considerarmos a conexão com a Pachamama e seus elementos como tema principal.

Do meu ponto de vista, o fato de existirem diferentes escolas xamânicas andinas é algo saudável; ou seja; todas se referem à “tradição andina”, que hoje se difunde pelo mundo de forma pluralizada, certamente algumas escolas como a Munay Ki adquiriu um impacto incomum, alcançando instituições em todo o mundo e em diversas línguas. No meu modo de ver, a rápida expansão do Munay Ki responde ao fato de que representa um método atraente disponível a todos, relacionado a etnia dos Q’eros e ao Xamanismo praticado nos Andes. A rápida disseminação de livros escritos pelo seu criador permitiu que o método fosse solicitado em todas as partes do mundo, porque se baseia em uma tradição milenar, rica em exercícios, técnicas e rituais práticos que toda pessoa pode realizar a partir da tranquilidade de seu lar.

O Munay Ki se expandiu pelo mundo de tal maneira que os mais presunçosos hoje preparam autonomamente a extensão a outros ritos adicionais e aderem às práticas e conhecimentos de outras escolas andinas, a fim de dar maior credibilidade ao método. Hoje até mesmo um grupo de xamãs Q’eros são convidados para realizar despachos (oferendas) e karpays (iniciações) como um suporte aos cursos de formações de Munay Ki. Curiosamente, por mais estranho que pareça, os próprios xamãs Q’eros vêm aprendendo o método de Munay Ki para depois praticá-lo conforme o modelo criado pelo Dr. Villoldo. Sim! Estes Nove “Ritos” que seu criador diz ser dos Q’eros, é na verdade uma adaptação de algumas técnicas ritualísticas desta etnia, misturado a elementos do Bon Budismo Tibetano (que deriva do Bon-po), tornando-o palatável aos ocidentais.

A propagação do Munay Ki nos Estados Unidos permitiu que as viagens ao Peru se tornassem um negócio sem precedentes, onde o participante da jornada deve pagar um valor não inferior a 3.500 dólares norte-americanos pelo trabalho xamânico de duas semanas naquele País andino sob os olhos do Dr. Villoldo. Para o turismo da região é atraente a vinda destes místicos, pois gera divisas e mobiliza o turismo local, como também o é para uma série de indivíduos que dizem ser “xamãs” e na verdade não o são, mas fazem uma série de atuações teatrais que terminam enganando os turistas que viajam até lá para ter acesso Medicina Nativa Tradicional dos povos originários dos Andes.

Hoje em dia é difícil definir quais são os verdadeiros ritos iniciáticos dos Q’eros, pois desde que eles surgiram para o Ocidente muitos antropólogos passaram a estudar e adaptar sua Medicina Nativa, criando uma série de cerimônias e rituais que não são originários deste povo. O mesmo ocorre com outras etnias nos Andes, como em outros lugares do mundo. A ideia do Dr. Villoldo é encorajar seus iniciados a continuarem aprofundando os estudos da sua instituição, se possível com seus próprios professores. Particularmente, aconselho aqueles que me procuram a abrirem a sua mente e estudarem outras tradições andinas, especialmente as mais autóctones, principalmente aquelas em que possam trilhar o caminho do conhecimento ancestral e que possa enriquecer seus aspectos pessoais e vivenciar plenamente a experiência espiritual, aprendendo a nos comunicar com nós mesmos e com tudo que nos rodeia (animais, árvores, estrelas, lagoas, montanhas, objetos sagrados, etc).

Existe uma série de escolas e tradições sobre a espiritualidade andina, algumas delas tem origem autóctone, outras não. Entre as de origem nativas podemos citar: Escuela Kawsay Puriy, Escuela de la Vida y de la Paz, Incas Conteporâneos, Kawsay Pacha, Kontiti, Qhapac Ñan, Samana Wasi, TINA e Willka Wasi. Entre as ocidentais podemos mencionar: Chaskinuna, Fundação Wiracocha, Janaqpacha, Tawatin e The Four Winds Society (Munay Ki).

De acordo com a tradição espiritual andina cada um de nós carrega uma semente de luz que pode ser desenvolvida a fim de alcançar a “iluminação espiritual”, que segundo a Tradição Iniciática Nativa Andina (TINA) a qual pertenço, só é possível ao trilharmos o caminho da Harmonia (Sumaq Kawsay). Na caminhada cada um encontra sua missão, ou é por ela encontrado, mas para isso há que se caminhar, logo, há que se ser um andarilho. Todos nós, sem exceção, temos o potencial para desenvolver espiritualmente. Ao sermos iniciados nos Andes, os Yachacs (xamãs) plantam dentro de nós uma semente de luz. Esta irá germinar, crescer e desenvolver-se como uma árvore mágica, frondosa e portadora por sua vez de sementes de paz, luz e amor universal.

Uma forma de ascese muito praticada pelos participantes da nossa Tradição é a Peregrinação Sagrada, na qual transcorre em dois planos. No plano físico, os peregrinos viajam desde o mundo cotidiano até os Locais Sagrados. No plano interno, a peregrinação é um desprendimento do paña (a consciência ordinária) até o lluq’i (a consciência do outro eu). Os Locais Sagrados são aqueles que são mais propícios para conectarmos conscientemente com o Spíritu que anima tudo que existe e a peregrinação é como a vida: um caminho de retorno para recuperar nossa unidade secreta com tudo que existe.

A Peregrinação Sagrada por locais de poder (huacas) nos ensina através do espírito, o amor incondicional, a recuperação da paixão pela vida, a comunicação e interação com nossos irmãos, a fluidez no meio de nossas batalhas diárias e nossa natureza como seres luminosos, associadas a cada um dos Grandes Poderes (a terra, o fogo, a água, o vento e o sol) que são explorados em cada um dos lugares sagrados que visitamos. Essa peregrinação, não é nada mais do que um Rito de Passagem preparatório para o início de uma nova etapa em nossas vidas em plena consciência. Diariamente realizamos rituais que facilitam uma imersão neste mundo sagrado que conecta nossas partes numa totalidade que se apresenta como Pachamama, nossa Mãe Cósmica. Entre as práticas e rituais a meditação ocupa o principal lugar. Meditar é o encontro com Pachamama, o Spíritu, com os animais, as árvores, as montanhas, consigo mesmo. Com o Sagrado, que está dentro de nós. É neste mergulho no silêncio interior que encontramos com o Spíritu. Ao praticarmos esta ascese, acreditamos estarmos vivendo de forma mais parecida com as que viveram nossos ancestrais andinos. As jornadas xamânicas de conhecimento organizadas por alguns dos nossos membros são uma forma de disponibilizar, aos seus participantes, o contato direto com a cultura e as práticas xamânicas dos nativos, assim como atualizar uma tradição milenar da qual eles também querem se sentir herdeiros. Empreender estas viagens é um ritual iniciático com um sentido iminentemente xamânico.

Fazemos parte de uma linhagem ancestral dos Runac Allincapac, os Hamawttas primogênitos, de saber que remonta ao princípio dos tempos nas Américas, somos apadrinhados pelo Sol e a Lua, guiado por Pachamama, pelas águias-xamãs, outros seres que também nos protegem. Nossa missão é ampla e interminável.

A TINA é formada por um grupo de indíviduos engajados em vivências que os remetem a culturas dos povos originários das Américas que se apresenta como fonte de inspiração para seu caminhar na Terra. Seus participantes se propõem a assumir um modo de viver que se expressa por meio de uma vida simples e devotada à nossa Mãe Terra e de uma conexão com os ancestrais nativos da América do Sul especificamente. Esta filosofia de vida torna-se condição para eles atingirem um conhecimento cada vez mais profundo de si e o seu bem-estar individual e coletivo. Sua legitimação social procura respaldar-se tanto na origem e sabedoria xamânica sul-americana, das quais se apresentam como herdeiros, quanto nos valores recentes de uma ética ecológica de preservação da natureza e do planeta, que adotam como ascese pessoal e grupal.

Nossa missão é honrar os ensinamentos da sabedoria sagrada dos Andes e compartilhar esta tradição para todo o mundo, com reverência, humildade e paixão. Estamos comprometidos em auxiliar a humanidade a se desenvolverem espiritualmente e tornarem melhores seres humanos. Valorizamos a importância de honrar uma profunda ligação com a Mãe Terra, com o outro e com nossos ancestrais para a criação de um belo legado para as gerações futuras. É por isso que a TINA dedica-se ao estudo, preservação e transmissão do conhecimento xamânico, realização de cerimônias e ritos que desenvolvam a nossa consciência e o crescimento pessoal.

Consideramos nossa Tradição como uma universidade espiritual, que se caracteriza pela incorporação de um modo de viver xamânico dos povos sul-americanos. Ao optar por um modo de vida mais simples e dedicado à Mãe Terra, o membro da TINA espera atingir um conhecimento cada vez mais íntimo de si, conectando-se com a Mãe Terra, Aliados de Poder, Ancestrais, o Spíritu criador de todas as coisas, e de acordo com a mitologia xamânica. A inserção na Tradição Iniciática Nativa Andina visa justamente oportunizar experiências que auxiliem os sujeitos a resgatar a comunhão que os ancestrais andinos mantinham com o Cosmos em todas as suas nuances.

Munay,

Wagner