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Brumas de Machu Picchu

 

Após percorrer durante três dias a famosa Trilha Inka, chegamos ao Intipunku (Portal do Sol) do Santuário Arqueológico de Machu Picchu. Fizemos a parte final de nossa jornada em completo silêncio. Caminhando em cima de regatos que cortam o caminho de pedra, rodeados por flores coloridas e de várias fragrâncias pudemos refletir sobre nossa peregrinação num lugar onde as pedras falam, pássaros sussurram doces melodias de conhecimento, e os ecos dos antigos chegam aos nossos ouvidos ricocheteando entre os Apus. Com esse sentimento dentro de nós, podemos ver as brumas da manhã envolvendo a Cidade de Cristal dos Inkas, Machu Picchu. Silenciosos, esperamos pacientemente os primeiros raios de sol surgir por detrás da Cordilheira Andina e iluminar com seus raios dourados os gramados verdes daquela cidade mítica e finalmente pudemos rever as pedras dos edifícios de Machu Picchu e a exuberância da montanha Wayna Picchu com a face do Puma Guardião incrustada nela. Neste momento bebemos da beleza e do poder da criação, e nos sentimos em casa mais uma vez.

Com a chegada dos primeiros raios solares, pudemos divisar uma série de turistas andando como se fosse uma imensa centopéia pelo chão de pedras milenar. Algo me pareceu estranho ao ver aquela cena, pois todos estavam percorrendo num único sentido. Não me parecia ser uma coisa natural aquilo. Sem procurar entender o que se passava, fiz o meu rezo aos Apus e a Pachamama e comecei descer a trilha em direção a Huayarana (Casa do Guardião). Durante o percurso observo que não ouço o som dos pássaros, outro fato que me deixa intrigado. Caminhando mais um pouco, chego ao lugar que é considerado pelos místicos como o mais poderoso de Machu Picchu, a huaca de La Hechinchera (Local da Feiticeira). Sou surpreendido em ver uma corda fechando a entrada até lá. “O que tá acontecendo?” – pergunto mentalmente. Ativando minha visão interna procuro pela presença da Feiticeira Mapuche que lá vivia no período incaico e que até anos antes sua forma espiritual continuava vivendo. Não consigo visualizá-la, mas escuto a sua voz dizendo que me aguarda em Killapunku (a Porta da Lua) na montanha Wayna Picchu. Consinto com a cabeça o chamado, mas não tenho como não pensar no que está ocorrendo naquela cidade.

Ao chegar na Casa do Guardião, verifiquei que o INC (Instituto Nacional de Cultura do Peru) havia feito uma série de regras como se comportar naquele Sítio Arqueológico sendo a maior delas a de que todos deviam seguir num percurso único ao entrar em Machu Picchu. No lugar de fazermos o caminho iniciático até a fonte que nos purificaria para entrarmos na Cidade de Cristal, éramos obrigado agora a fazer uma rota mais curta até a Huayarana e de lá descermos na direção da pedreira até a Praça Cerimonial, para a partir daí irmos até o Templo do Sol para ver o Intiwatana (Amarrador do Sol) e depois cruzarmos a Praça Central para enfim chegarmos ao Setor dos Amautas, onde os sábio andinos ensinavam os segredos da vida e da morte aos seus alunos naquela que foi sem dúvida uma Universidade Viva. Mas algo muito sério estava ocorrendo naquela cidade agora, pois ao percorrer todo o trajeto até o Templo do Condor observei que as pedras não mais pulsavam como antes e não senti nenhuma presença espiritual ali. Intrigado, resolvi desvendar o que estava acontecendo e segui em direção ao portão de acesso a Wayna Picchu.

Após preencher meus dados e escrever a hora de ingresso na montanha, comecei a percorrer a trilha que me levaria até a Porta da Lua, também conhecido como Templo da Lua. Caminho por alguns minutos até a bifurcação que nos leva para o topo do Wayna Picchu ou para baixo que será o meu destino naquele dia. Eu tinha feito este caminho no ano de 2016 com um pequeno grupo, mas desta vez eu tinha um encontro com minha amiga espiritual e deveria ser só. Para chegar até lá passo por caminhos estreitos e tão impressionantes que causam vertigem, porém a parte mais perigosa da jornada são as escadarias chamadas de escadas da morte com degraus com 35 cm de altura, 70 cm de largura e 15 cm de profundidade, sendo que ao lado dela temos a parede da montanha e do outro um abismo de 400 metros até o rio Urubamba. Desço cuidadosamente até chegar a Grande Caverna onde está localizada a Porta da Lua.

O Templo é constituído por duas cavernas naturais, a primeira delas está sob uma enorme pedra, já a segunda tem nichos e um edifício com porta trapezoidal (clássica durante o período incaico) que une as duas cavernas. Foi neste local no fundo da caverna que pude rever, mais uma vez, a Feiticeira de longos cabelos brancos. Ela estava sentada numa pedra crua e fazendo sinal para que eu me aproximasse. Ao chegar perto, visualizo um brilho naqueles olhos profundamentes frios e a vejo sorrir para mim. Já fazia algum tempo que não nos viámos frente a frente, mas ela seguia igual como sempre fora para mim. Após nos abraçarmos, ela sinaliza para que eu sente ao seu lado. Neste momento, a caverna é invadida por um forte nevoeiro. Sinto ela segurando forte a minha mão e uma série de imagens surgem no meio das brumas a nossa frente. Vejo uma série de Encantos (seres encantados) que ali viviam até anos antes, deixando aquela cidade por uma trilha em direção as montanhas Pumacillo e Salkantay, seguido por uma revoada de pássaros. Espantado, olho para a Hechinchera que diz:

– Esta cidade já foi o Local de Poder mais sagrado e poderoso dos Andes, mas depois de tanto movimento diário de turistas e pesquisadores a energia do lugar foi diminuindo até ficar completamente estagnada. A cidade continua a impressionar a todos que aqui vierem, mas sem a essência do poder numinoso que teve algum dia. Tal como os invasores estrangeiros expulsaram os Inkas de Cusco, os turistas de todo o mundo (inclusive nativos) afugentaram os espíritos que davam vida a este lugar.

– E para onde eles foram – pergunto.

– Como a história se repete, eles percorreram o mesmo caminho que o último Inka realizou na ocasião da queda do Tawantisuyu (Império Inka) e seguiram até Choq’kiraw a cidade irmã de Machu Picchu. Como sempre me mantive a parte da maioria deles, por essa razão irei me refugiar na Ñaupa Machay, a Caverna dos Ancestrais em Pachar e ficarei alegre em poder revê-lo sempre que lá for. Você deve estar se perguntando o porque de Choq’kiraw, mas apesar da escolha histórica existe uma razão numinosa para essa migração esse Lugar de Poder. Esta cidadela é três vezes maior do que Machu Picchu, e somente foram descobertos 30% dela. Supostamente, o fluxo de turistas até ela é e será bem inferior ao de Machu Picchu. Aqueles aventureiros que tenham coragem de vigor para fazerem essa trilha a pé, poderão desfrutar de um Local de Poder com toda a sua força e se tiverem “verdadeiros olhos” poderão ver e conversar com os Seres Encatados que lá estão, juntos com aqueles que migraram daqui para lá.

Após a minha conversa com a Hechinchera, deixo a Grande Caverna de 7 metros de profundidade, 12 m de largura e 3 m de altura. No caminho de volta até o portão de Wayna Picchu sou pego por uma chuva, o que deixa o chão mais escorregadio do que o normal. Durante todo o percurso sinto um misto de tristeza e alegria dentro do meu ser. Infelizmente a Cidade de Cristal não é mais a mesma, e deve permanecer envolta em brumas ao amanhecer porém sem vida. Por outro lado, os Encantados mesmo em outro local, voltarão na noite de lua cheia para dançar no Pátio Central como faziam outrora a luz do luar.

Fico feliz pelos Seres Encantados ainda permanecerem em outros Locais de Poder nos Andes. Muitos dos Encantos são entes que aqui viveram, mas nem todos são espíritos de mortos, alguns são de outras dimensões e têm interesse no desenvolvimento do nosso planeta, fazendo com que despertemos aqui e agora deste sonho. Vivemos um momento de tensão planetária, os sucessivos alinhamentos planetários, a energia dos eclipses, tudo isso está ainda em atividade e começa agora a chegar no campo físico terreno, depois de ter passado pelos campos mais sutis do planeta. É chegada a hora de nós como seres em evolução das mais diversas tradições, nos unirmos numa dança com os Seres Encantados e transformar essas energias. Transmutemos com nossas fogueiras, cantos, cristais, ervas, animais de poder e seres de outros mundos, a energia bruta que está chegando dos astros para o plano desta realidade.

Estamos na batalha tão esperada, sutil, constante, onde cada triunfo sobre nossas falsidades interiores é também uma vitória rumo a um mundo equilibrado. Vivemos o fim de um ciclo, e uma nova era se inicia. Os gêmeos do pólen, o menino e a menina que vêm do leste, trazem a semente da Primavera consigo, o brilho do novo, do que germina e nasce. É um novo começo, é um novo momento. A Grande Tribo do Arco Íris, os Seres Encantados e outras tradições partilham dessa luta por um novo estado de consciência e atuam a partir da irradiação, isto é, que cada ser realize-se plenamente dentro de suas próprias fronteiras. Aproveitemos essa onda e recuperemos nosso encanto, recitando encantamentos e realizando-os em nossa vida diária. Desta forma, as brumas se desvanecerão e o mundo encantado se mostrará novamente, presente onde sempre esteve, atrás da cortina chamada realidade. Seremos mais uma vez conscientes de que não fomos expulsos de lugar nenhum, mas apenas nos esquecemos que viemos das estrelas… e agora é hora de lembrar e celebrar.

É o momento de celebrarmos a Vida, nesta Era de Morte.

Munay,

Wagner Frota