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Mesa Norteña

Geralmente, os Curandeiros andinos como também de outras tradições nativas, possuem objetos de poder que são colocados em sacolas de poder. Estes objetos são herdados de seus Mestres e são enriquecidos com novos objetos que podem ser comprados, confeccionados, ganhos ou encontrados. No Peru, são chamadas de “Mesa Nortenã”, o altar sagrado dos xamãs e curandeiros que habitam as serras e costa do Peru setentrional nas províncias de Huancabamba e Ayabaca que pertencem ao Departamento de Piura, que ficam localizadas a meio caminho entre a costa, serra e selva.

O fenômeno cerimonial conhecido como “Mesada” no norte do Peru, incorpora uma série de elementos peculiares como o emprego do San Pedro, que os participantes tomam e o Curandeiro consome para “ver” e utilizar as “artes” e “encantos” (espíritos) que resultem mais conveniente; a disposição de um conjunto diversificado de objetos (espada, punhais, varas de madeira tropical, maracás, pedras, objetos arqueológicos, imagens cristãs, etc.) sobre uma manta configurando um altar de “poder”.

As “artes” são o nome que se dão aos objetos de poder da Mesa, que são utilizados para nos conectarmos com as forças da natureza. Um aspecto peculiar da “Mesa Norteña” é a utilização de diferentes varas, espadas e punhais que são colocados em sua cabeceira. Boas partes dos objetos, junto com outros “encantos” da Mesa, protegem o Curandeiro e o defendem das “sombras” e duplos dos “maleros”, feiticeiros que pretendem agredi-lo.

A utilização do San Pedro ativa os poderes dispostos na Mesa. As virtudes que possuem só podem ser contempladas e manipuladas convenientemente sob os efeitos do San Pedrito. Os objetos são depositários de poder que o San Pedro mostra ao Curandeiro. Os objetos adquirem uma relevância individual única, personificada em cada caso para intervir no problema que afeta os pacientes. Os “encantos” da Mesa, encarnação física dos poderes utilizados pelo Curandeiro, têm uma natureza semelhante aos espíritos dos locais sagrados, as lagoas e montanhas. A “Mesada” é aberta com o florescimento (carga) dos objetos, para tal fim o Curandeiro cospe uma mistura de água florida, suco de lima, açúcar, tabaco e talco sobre eles. Esses tipos de oferenda são muito bem recebidos pelos lugares sagrados, os espíritos das lagoas e montanhas, e os “encantos” da Mesa.

As “artes” geralmente são distribuídas em três campos cerimoniais específicos. A parte esquerda da Mesa se conhece pelo nome de “Mesa ganadera” e relaciona-se com as forças escuras e malignas. A “Mesa ganadera” é constituída tradicionalmente por pedras procedentes de ruínas arqueológicas, de locais de poder e por uma concha “Toro”, de forma espiralada e também conhecida pelos nomes de Tríton ou de Netuno. Esse campo incluí uma série de varas e espadas. O lado direito da Mesa é conhecido como “Mesa Justiceira”, é o domínio de Cristo e Santos, os objetos desse lado da Mesa contém as virtudes e poderes competentes para tratar as aflições dos pacientes. Imagens de Santos, cristais, conchas, maracás, perfumes, tabaco negro e crucifixo, são elementos próprios deste “campo” junto com sete varas e espadas. No meio da manta se encontra a “Mesa do meio”, que atua como o fiel da balança entre a “ganadera” e a “justiceira”. Geralmente na “Mesa do meio”, utiliza-se diversas pedras, espelho e uma imagem de San Cipriano.

Objetos como a espada maior, a vara de Chonta (vara de defesa), o maracá, as conchas e caracóis marinhos são inseparáveis da Mesa do Curandeiro. Este sem sua espada e sua vara, não pode defender a si mesmo e seus pacientes dos ataques de “maleros” e de “vientos malos”, sem o maracá ele não pode chamar seus espíritos auxiliares e sem as conchas não poder efetuar a “singada” de tabaco.

Aprendi com a minha Maestra, que as “artes” devem ser harmonizadas por quem irá utilizá-las. Caso isso não ocorra, o poder do objeto torna-se perigoso, até mesmo para quem o opera. Conseqüentemente, cada “arte” deve ser ritualisticamente preparada por quem deverá manuseá-la. “Compactar as artes” é o nome que se dá a esse ritual que realizei com as minhas artes a beira de uma lagoa nos Andes. Seu objetivo é despertar cada uma das “artes” evocando o poder (espírito) que a anima e sintonizá-la com o operador. Na maioria das vezes, o Curandeiro toma San Pedro para descobrir qual ente reside no objeto, ao reconhecê-lo, descobre a função da “arte”.

Cada “arte” presente na Mesa do Curandeiro é o suporte visível de um poder invisível, o “encanto”. Esse poder é derivado da presença do ente mítico (o espírito) que anima o objeto.

Os objetos presentes na Mesa são símbolos ativos de um universo de forças e meios para comunicar-se com elas e a Mesa em si é um mapa simbólico do cosmo de acordo com cosmologia andina.

A Mesa é um paradigma simbólico no qual o ritual de cura é jogado. Representa a luta entre as forças que tomam a vida e as forças que a dão, entre a esquerda e a direita. Porém esta luta, esta oposição chega a ser uma resolução pela reafirmação do xamã sobre seu domínio sobre a esquerda e a direita. Provando mais uma vez que o xamã é um balanceador de forças opostas. Para ele o jogo ritualístico que a Mesa representa em símbolos concretos, é um ato de harmonização realizado por um indivíduo que se mantêm separado da competência por meio de seus domínios em ambos os lados. É assim que a luta, a oposição, chega a ser transmutadas e as curas se realizam.

Na escolha das “artes” existem fatores determinantes tais como:

– A origem do objeto – se pertenceu a um curandeiro poderoso; se foi encontrado em algum lugar de poder como determinadas montanhas, lagoas, cavernas, ruínas ou tumbas pré-colombianas.

– Se o objeto faz parte de um animal ou Planta Mestra.

– A forma do objeto, como é o caso de certas pedras cuja forma sugere figuras significativas dentro de um mundo simbólico ou mágico.

– A cor, entre elas a vermelha é importante pela sua relação com o sangue; o branco com a pureza, auxiliando na desintoxicação dos contágios, proporcionando boa sorte e ligada a parte direita da Mesa; o negro pela sua relação com a noite, a escuridão que impede a visão dos “maleros”, a morte e o subterrâneo, a parte esquerda da Mesa.

– As qualidades próprias dos objetos como a transparência e magnetismo.

– A função própria do objeto como cortar e defender-se, como as espadas e punhais.

– Nome, como é o caso da colônia Água Florida pela sua relação com a função de florescimento.

– Fatores psíquicos como a ressonância afetiva que as “artes” tem com o Curandeiro, tal como o momento em que o curandeiro encontrou ou recebeu a “arte” das mãos de seu Mestre e também o poder de evocação que o objeto exerce na psique do xamã.

Aprendi com minha “Maestra” que cada um dos objetos da Mesa, adquire uma identidade funcional em relação com o mundo mítico no momento em que sua “virtude” (seu espírito) se manifesta pela primeira vez ao Curandeiro em visão.

Após a escolha dos objetos, ocorre um ritual chamado compactar, palavra que expressa o pacto entre as “artes”, a lagoa e o Xamã que trabalhará com elas. Todos os objetos são submersos na lagoa, pedindo que a lagoa assista o Xamã em seus trabalhos. Feito esse ritual toca-se um sino de prata ou de outro metal que tenha um som claro, na intenção de despertar os objetos. É efetuado então uma cerimônia de recomendação explicando a “arte” quando ela deverá intervir com seu poder, para que deverá servir e como auxiliar o Xamã.

Segue um pouco sobre cada um objetos de poder que fazem parte da “Mesa Norteña” e para que servem. Na minha Mesa tenho algumas destas “artes”, mas não tão completa como as explicações abaixo dadas pelo escritor Mario Polia Meconi no livro “Despierta, Remedio, Cuenta…”: Adivinos y Médicos del Ande.

“As Varas de madeira de árvores cujo poder mágico é apreciado e temido tomam parte da Mesa de cada Curandeiro do Norte do Peru. A madeira mais usada é a Chonta, uma palmeira que cresce na selva, muito dura e utilizada para fabricação de lanças e burdunas. São utilizadas ao lado esquerdo da Mesa, para ser utilizada como defesa para as energias negativa. O Espírito desta palmeira é identificado com o Supai, uma entidade mítica perigosa. Os Jívaros o chamam de Iwanchi, cujo significado equivale o de Supai e que se refere a uma entidade maligna da selva. Seu poder mágico é reconhecido por todas comunidades indígenas, que a utilizam para fabricar suas lanças, arpões e flechas. As setas de zarabatanas também são fabricadas com a Chonta. Sua madeira também é utilizada para alimentar o fogo que irá ferver o curare, veneno que paralisa á vítima.

As varas de Chonta são utilizadas para defender-se e para limpar os pacientes de contágios.

Entre todas as varas, a mais importante e indispensável é a Chonta, a ponto de que os antigos Xamãs, diziam que “Chontear” era sinônimo de atuar ritualmente.

Existem outros tipos de madeira que servem para serem utilizadas como vara, são elas: Hualtaco, Palosanto e Guayacán. Todas elas têm como características comuns o poder de afastar “vientos malos”, contágios e inveja pela sua simples presença na Mesa.

As varas sempre estão dispostas em fila paralela na borda exterior da Mesa e na parte oposta do Curandeiro, formando uma barreira ideal que defende ele e seus pacientes das forças negativas. A Chonta maior, junto com a espada maior ocupa tradicionalmente o centro da Mesa. As posições da vara mudam de Curandeiro para Curandeiro, dependendo da qualidade e função de cada uma. Normalmente as de cores escuras (Hualtaco Negro e Chontas Negras) ocupam o lado esquerdo da Mesa; a Chonta mais clara e Gayacán ao centro, e o Palosanto a direita, sendo que a Chonta mais clara também pode ocupar esse mesmo lado.

Espadas e punhais também fazem parte da “Mesa Norteña”. Seu prestígio mágico está ligado com o poder de ferro e de suas características de arma que são utilizadas para defender e atacar.

Elas são de diversos tipos e tamanhos. A espada do Curandeiro deve ser virgem, nunca deve ter tocado sangue, nem manteiga, sal, alho e cebola. Só pode ser forjada por um ferreiro que obedeceu aos jejuns especiais. Ao ser forjada, a nova espada deve ser banhada nas águas de uma lagoa de poder reconhecido e ser ritualisticamente compactada. A recomendação é feita nas primeiras luzes do dia.

A espada principal, ou maior, durante as cerimônias ocupa o centro da Mesa, fincando no terreno. Afasta o contágio, é utilizada para cortar as influências negativas e suas forças e para limpar os pacientes.

Conchas e caracóis marinhos como “filhas das águas” são símbolos de fecundidade, tal como a Terra, é um elemento feminino e maternal: Mamacocha, a Mãe Água. Sua aparência assemelha-se em muitos casos a vagina. Seus caracóis relacionam-se com a espiral e o simbolismo lunar que esta expressa.

Elas são elementos indispensáveis na Mesa desde tempos remotos. São pensando nelas, que é preparado a mistura do tabaco, álcool e ervas para as “singadas” variando de acordo com o tipo de concha e qualidade do tabaco. “Conchear” é um termo antigo utilizado pelos Xamãs que expressa a cerimônia terapêutica que executam utilizando as conchas.

Existem diversas espécies de conchas que são utilizadas pelos Curandeiros em suas Mesas. Entre elas encontra-se um caracol marinho de uma dimensão avantajada chamado “Toro” (Touro), que escutamos um barulho do mar ao coloca-la no ouvido, e ao sopra-la produzimos o mugido de Touro. São muito utilizadas para defesa das energias negativas.

Pedras são empregadas ritualisticamente em todas as práticas terapêuticas, adivinhatórias e mágico-defensiva. Elas são escolhidas de uma forma singular visando sua interpretação simbólica. Entre as pedras mágicas ativas existem os cristais de quartzo transparentes que goza de um grande prestígio entre as pedras; as pedras brilhosas; os meteoritos; as redondas encontradas nos rios e quebradas; as que tem forma especiais, antropomorfas, zoomorfas ou falomorfas; as encontradas em lugares sagrados; e as que atraem os metais.

Entre as “artes”, as pedras ocupam 70% dos objetos da Mesa e estão distribuídas por todos os lados de acordo com a função mágica de cada uma.

Artefatos arqueológicos tem o poder de defender o Curandeiro e de contra-atacar seus inimigos. Sua função é muito importante dentro do ritual de luta pelo qual o Xamã obtém a cura de seus pacientes. Na maioria dos casos esses artefatos são armas pré-colombianas, esculturas feitas em pedra ou metal, e cerâmicas.

Maracás são instrumentos tradicionais sempre presentes entre os objetos de poder do Xamã. Servem para acompanhar ritmicamente as fórmulas mágicas cantadas. Tradicionalmente elas são feitas de cabaças com sementes ou pedras em seu interior. Algumas são de cobre ou outro metal. Raramente encontramos as feitas de argila, mas são usadas pelos Xamãs mais velhos.

Os Curandeiros também as utilizam em operações de defesas e também para florescimento. Algumas delas, principalmente as feitas em prata, são utilizadas especialmente para despertar as “artes”.

Colônias e perfumes são ingredientes imprescindíveis em todo tipo de oferenda e rito. Os Curandeiros distinguem nitidamente entre colônias fabricadas industrialmente e perfume obtidos através das sementes e flores, que são misturadas com a chicha, aguardente ou vinho.

Colônias industrializadas como a Água Florida, são muito utilizadas para oferendas ao San Pedro, a Pachamama e os Lugares Sagrados por serem fáceis de encontrar e baratas. Caso tenha condições de escolher o Curandeiro prefere sempre usar nestes casos os perfumes feitos de sementes e flores, que são chamadas de Montanhesas, principalmente na cerimônia de florescimento.

Os Curandeiros peruanos afirmam que os perfume e colônias servem para atrair os bons espíritos e afastar os maus. No norte do Peru, quanto mais alta a qualidade de perfume e seu preço, mas efetivo é o seu poder e, mas seguro é o efeito do rito.

Bebidas são também utilizadas na “Mesa Norteña”. Entre elas temos a água, álcool e vinho. Falarei um pouco sobre cada uma delas a seguir:

Água das lagoas situadas nas cordilheiras são utilizadas em rituais e são tomadas como remédios por causa de seus poderes terapêuticos.

A água é um elemento feminino, é a essência da Terra. Para produzir vida deve se juntar ao poder fecundador do Sol. Porém se quisermos utilizá-la em todo seu poder, e sua virgindade, temos que apanhá-la antes do amanhecer, quando brota das profundezas da terra com toda sua energia e frescura.

Ela está associada à mulher, a chuva, as conchas, ao sub-solo e a purificação. As oferendas principais a esse elemento são as coisas frescas e doces, tais como: o milho, talco perfumado, perfumes doces, limas, rosas e flores brancas. Entre os metais se oferece a prata que esta associada à lua.

Álcool de cana se utiliza para a preparação do tabaco nas “singadas” pois o álcool etílico presente na aguardente permite uma mais rápida e eficaz extração e solução alcóolica dos princípios ativos da planta.

O álcool é utilizado também como defesa do Xamã contra seus inimigos em um ritual que se realiza soprando o álcool com força na direção do inimigo, obtendo o mesmo efeito de como se estivesse soprando-o nos olhos, escurecendo a vista do adversário. Com a mesma finalidade de defender-se se usa o álcool soprando até os espíritos hostis para embriagá-los e torná-los inofensivos.

Vinho branco, preferencialmente os adocicados são oferendas que fazemos as Mesas.

Alimentos tais como mel, açúcar branco, milho, cana de açúcar e limas são utilizadas em todas as Mesas dos Curandeiros “Norteños”.

O mel é utilizado para dores de estômagos e principalmente nas oferendas que servem para adoçar os espíritos. Também é indispensável para oferendas as águas e as “artes”.

O açúcar é utilizado basicamente para preparação do “Arranque”, uma bebida que funciona como um antídoto aos efeitos psicotrópicos das Plantas Mestras, tais como o San Pedro e Misha.

O milho moído também é utilizado na preparação do “Arranque”, mas é mais conhecido na fabricação da Chicha e também é utilizada como oferenda.

Animais e suas partes são utilizados pelo curandeirismo andino do norte. Nos dias de hoje o Porco da Índia (Cuy) é utilizado como diagnóstico e em certos rituais de expulsão das enfermidades, transferindo o contágio para o animal e deixa-o livre para que o bosque ou o lago devore o contágio.

Gordura de iguana e serpentes, misturados com álcool, curam reumatismo e distúrbios causados pelo frio; também são utilizados para curar feridas difíceis de cicatrizar. Já a gordura que envolve os intestinos da galinha misturada com álcool utiliza-se para curar deslocamentos.

A pata de puma se utiliza na magia amorosa e negativamente para atrapalhar a alma da vítima. Pode também ser usada como arma de defesa do Xamã.

Bicos de pássaro e seus corações são utilizados na magia amorosa. Já as unhas de anta são utilizadas pelo seu poder de afastar os “vientos malos”.

Imagens católicas são comuns nas Mesas Curandeiras. Estas servem para defender o Curandeiro e seus pacientes. Na maioria das invocações que se fazem a estas imagens, é pedido permissão a Deus para trabalhar com elas. A seleção das imagens é feita pelo Curandeiro segundo sua devoção pessoal a um ou outro santo. Os objetos católicos mais comuns são o crucifixo, cruz de caravaca e imagens de santos.

O Crucifixo esta tradicionalmente ligado ao Centro da Mesa, em frente à espada maior e a Chonta principal. Algumas vezes, principalmente quando se trata de libertar o paciente de algum feitiço, o Curandeiro abençoa o paciente pondo o crucifixo em sua cabeça, no peito e costas.

A Cruz de Caravaca é eficiente para curar toda classe de doenças como também inúmeras práticas para libertação de feitiços e encantamentos com benção e exorcismos.

San Cipriano sua imagem está relacionada ao prestígio mítico do bruxo Cipriano. O livro de San Cipriano é um sincretismo de magia renascentista com algo de espiritismo e ocultismo, sendo esse livro muito utilizado pelos “maleros”. Este livro às vezes se encontra na Mesa perto da imagem de San Cipriano, do lado esquerda da Mesa.

A imagem do Santo serve para defender-se contra forças maléficos e também para atacar os inimigos do Curandeiro”.

Sintetizando sobre a Mesa, o Xamã “joga” contra adversários visíveis e invisíveis (homens e espíritos) e em seu jogo, ele tem que observar regras estritas e cuida-se para se livrar das armadilhas, a aposta pode ser a sua própria vida em troca da vida e saúde de sua gente. A expressão do léxico curanderil vislumbra o imprevisível desconhecido e o marco do dualismo conceptual, sobrepõem o caráter da contenda entre as artes do Curandeiro que propiciam saúde e sorte, e aquelas do “malero” que engendram enfermidade, morte e desgraça. A mesada e toda atividade do Xamã é uma luta, um duelo ritualístico no intento de controlar e equilibrar por meio de instrumentos rituais o dualismo da existente luta para seguir existindo entre a vida e morte, a saúde e a doença, a sorte e a desgraça.

Como podemos observar, a síntese xamânica andina há conservado estruturas e elementos originários de sua cosmologia e cosmografia autóctone mantendo-os ativos dentro do contexto sincrético cristão. Assim como há conservado a re-interpretação cristã os velhos mitos de origem e a estrutura ritual das práticas terapêuticas e adivinhatórias ancestrais. A Mesa mesma é um compendio visível que expressa esta síntese religiosa através de objetos-símbolos.

Finalizando, a Mesa Curanderil, assim como a análise estrutural manifesta deve ser considerada um templo de acordo com o significado técnico do termo, um espaço sagrado ritualmente separado do espaço profano, um microcosmo litúrgico e ritualmente ordenado e baseado num modelo de macrocosmo que a Mesa compendia em forma simbólica sendo cada parte deste microcosmo analogicamente relacionada com a parte do macrocosmo que lhe corresponde e com o conteúdo da visão em que ela se desenrola.

Wagner Frota