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Os Olhos do Jaguar

O Tatu tinha mandado os seus olhos passear a beira do lago.

– Vai, meus olhos, vai para a beira do lago. Vai! Vai! Vai! – tinha dito. E os seus olhos tinham voado na direção do lago como as borboletas.

Ao fim de um minuto, teve vontade de os tornar a chamar.

– Volta, meus olhos, volta imediatamente.

Havia vários dias que o Jaguar observava essa curiosa cena. Não conseguia acreditar no que via. Aproximou-se do Tatu e disse-lhe:

– Como é que fazes isso?

– Olha. Vou-lhes falar. Vai meus olhos, vai para a beira do lago. Vai! Vai! Vai!

E os olhos voaram em direção ao lago.

– Volta, meus olhos, volta imediatamente.

E os olhos voltaram imediatamente.

O Jaguar tinha muita vontade de viver a mesma experiência. Pediu ao Tatu que enviasse também os seus olhos para a beira do lago. O Tatu não quis.

– Não agora não. O monstro vai devora-los.

– Sim, eu quero que tu o envies.

– De acordo – respondeu o Tatu -, mas por sua conta e risco!

E enviou os olhos do Jaguar para a beira do lago. Ao fim de um momento, chamou-os:

– Voltai, olhos do Jaguar, imediatamente.

E eles voltaram às suas órbitas.

– É maravilhoso, eu quero que eles vão mais uma vez à beira do lago – disse o Jaguar.

– Não, agora é muito perigoso, – respondeu o Tatu – o monstro aproxima-se, vai devora-los.

– Sim, por favor, mais uma vez, a última. Seja simpático.

Mas o Tatu tinha razão. O monstro estava lá e comeu os olhos do Jaguar. O Tatu tentou pronunciar as palavras mágicas, mas os olhos não voltaram, o Jaguar estava cego para sempre. Imediatamente o Jaguar quis se vingar e ameaçou o Tatu de o comer, mas este último foi refugiar-se sob a raiz de uma árvore. O Jaguar raspava as raízes da árvore, mas não encontrava o Tatu. Não via nada e, ao tocar a carapaça do Tatu, era como se fosse madeira. Foi depois desse dia que passaram a ter o dorso estriado por causas das garras do Jaguar.

O Jaguar pôs-se a andar pela floresta, sem saber para onde ia. Não podia caçar mais e via-se condenado a morrer de fome. Parou ao pé de uma árvore e deitou-se. Que fazer? Um Gavião-Real veio pousar perto dele e perguntou-lhe:

– Que fazes aí, que se passa, onde estão os teus olhos?

O Jaguar contou-lhe a sua história extraordinária e o Gavião-Real teve dificuldade em acreditar. O que era certo, contudo, é que o Jaguar estava cego. Decidiu então ajuda-lo.

– Fica aí – disse-lhe -. Vou buscar o que preciso para te fazer outros olhos. Se esconderes a cabeça entre as patas, ou outros animais não verão que vós estais cegos e não correra risco algum.Todos têm medo de ti, não ousarão aproximar-se. Vou trazer-te leite de jatobá. – E levantou vôo.

As horas passavam, mas o pássaro não voltava. O Jaguar começava a inquietar-se, quando se ouviu um grande barulho. O Gavião-Real acabava de deixar cair perto de suas patas tudo que havia lhe trazido para lhe fazer outros olhos.

Disse ao Jaguar:

– Estende-te e não se mexas. Isto vai-te queimar, mas é preciso que suportes a dor.

E fez correr o líquido fervente na órbita direita do jaguar. Este nem mesmo gritou. O Gavião-Real encheu então a órbita esquerda. Depois lavou os olhos que acabava de fazer com a seiva de uma outra árvore.

Os novos olhos do Jaguar eram muitos claros, ainda mais belos do que ele tinha antes do seu acidente.

– Como poderei agradecer-te? – disse o Jaguar.

– Basta que mate um tapir para mim, é o meu petisco preferido.

O Jaguar pôs-se imediatamente à caça. Trouxe um enorme tapir, que agradou muito ao seu novo amigo.

Depois desse dia, o Jaguar deixa sempre uma parte da sua caça para o Gavião-Real, em lembrança dessa aventura.