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As Quatro Criações do Homem

O Princípio do Mundo, quando só o céu e o mar existiam, reuniram-se em conselho sete deuses: os quatro guardiões dos cantos do Universo, Tepeu, o operário, Gucumatz, o senhor do manto de plumas verdes, e Hurucan, também chamado “Coração do Céu”. Estes deuses espalhavam pelas trevas uma luminosidade resplandescente.

Quando chegarem a acordo, Huracan lançou os raios e os relâmpagos, fez ribombar os trovões e pronunciou a palavra “Terra”: a terra surgiu imediatamente à superfície do mar, ergueram-se as montanhas, escavaram-se os vales e uma vegetação verdejante cobriu a paisagem para grande satisfação de Gugumatz:

– Muito obtigado, Huracan! – exclamou ele.

– A nossa obra não terá sentido se não houver ninguém para nos felicitar – observou um dos deuses. – Criemos, pois, seres perfeitos, que nos venerem e cantem louvores.

Lançaram-se ao trabalho e, assim, deram origem aos primeiros habitantes da Terra: as aves, as serpentes e os animais ferozes. Os deuses definiram a linguagem de cada espécie e decidiram empregar os animais como defensores dos vegetais.

– Agora, venerem os vossos criadores! – ordenaram – Invoquem os nossos nomes! Honrem a nossa glória!

Infelizmente, os animais só conseguiram chilrear, silvar ou uivar. Decepcionados, os deuses concluíram que estes primeiros seres vivos não eram perfeitos e disseram-lhes:

– A partir de agora, estão condenados a ser perseguidos, mortos e devorados.

Poucos conformados com o insucesso, os sete deuses decidiram, então, fabricar os homens que, pensavam eles, saberiam mostrar-se reconhecidos para com seus criadores. Assim, com auxílio de terra úmida, moldaram um povo inteiro de seres humanos, mas, mais uma vez, sofreram uma decepção. De fato, se bem que animadas e capazes de falar, estas estátuas de argila não conseguiam voltar a cabeça e olhavam sempre na mesma direção; além disso, desfaziam-se em contato com água. E, acima de tudo, os deuses censuravam-nas por não terem nenhum sentimento e não darem provas de mais inteligência do que os animais. Destruíram-nas, pois, e reuniram-se uma terceira vez para conseguirem uma maneira de criar homens que recordassem deles:

– Experimentemos a madeira! – disseram uns aos outros. A Terra povoou-se rapidamente de manequins talhados em madeira. Falavam, reproduziam-se, sabia construir casa. Mas, não tinham coração, não compreendiam nada, andavam à toa. Tal como as estátuas de argila, os manequins de madeira ignoravam os seus criadores. Caíram, então, em desgraça, secaram e os deuses condenaram-nos a desaparecer totalmente da superfície da Terra. Durante dias e dias, sem para, ordenaram que caísse do céu uma chuva negra como as trevas, acompanhada de torrente de resina. Para escaparem à inundação, os homens tentaram refugiar-se nos telhados ou árvores, mas os animais domésticos e os utensílios, descontentes com os maus tratos sofridos, revoltaram-se por sua vez e perseguiram-nos. Os raros sobreviventes desta raça de madeira conseguiram esconder-se nas florestas, onde deram origem a uma espécie de macacos pequenos que vivem nas árvores. Decididos a criar homens verdadeiros, custasse o que custasse, os deuses reuniram-se novamente na escuridão da noite: teriam de o conseguir antes da aurora!

– Falta-nos um material nobre, do qual faríamos a carne e o sangue dos homens, e que lhes transmitiria simultaneamente a vida, a força e a inteligência. Mas onde obtê-lo? – interrogavam-se eles. Enquanto os deuses refletiam, aproximaram-se quatro animais: o jaguar, o coiote, o lobo e a coruja.

– Conhecemos esse material excepcional – anunciaram. – Sigam-nos!

– Conduziram os deuses para uma região onde cresciam espontaneamente muitas plantas comestíveis, como o milho branco e o milho amarelo.

– Aqui está a planta mágica da qual faremos os homens! – decidiram os deuses. Debulharam as espigas, moeram os grãos amarelos e brancos, e fabricaram uma pasta com a qual moldaram a carne de quatro homens. Eram, finalmente, seres inteligentes! Agradeceram aos deuses, invocando os seus nomes. Viam através das trevas, falavam a mesma língua e tornaram-se tão sábios como os deuses, Estes acabaram por se inquietar:

– Desta vez, excedemo-nos, reduzamos o seu poder!

Lançaram, então, aos olhos dos homens uma nuvem de vapor que lhes embaçou a visão, de tal modo que, a partir daí, só vêem, de todo o Universo, o que se encontra próximo. Finalmente satisfeitos, os deuses criaram quatro mulheres de milho e colocaram-nas junto dos homens enquanto estes dormiam. Ao despertar, tiveram a alegria de ver as companheiras: acabava de nascer o povo Maia.